Por André Bozzetto Junior
João estava sentado no interior de sua jaula comendo um pedaço de pão, quando viu a porta da cabana se abrir e adentrar através dela a velha decrépita que o mantinha em cativeiro. O seu medo habitual aumentou ainda mais quando ele viu que a anciã arrastava pelos cabelos uma menina de feições familiares. Era Maria, sua irmã.
– Pode se alegrar, garotinho! – gritou a bruxa, com voz estridente – encontrei na floresta essa bela menininha para lhe fazer companhia!
De forma bastante rude, a velha abriu a porta da jaula, que ficava ao lado daquela onde João estava preso, e atirou a menina em seu interior, trancando-a em seguida.
– Maria! O que você estava fazendo na sozinha na floresta numa hora dessas?! – exclamou João.
– Estava procurando por você! – respondeu a menina, em tom choroso – Nunca aceitei terem te abandonado.
– Mas você sabe que nossos pais não tinham escolha. – tentou argumentar João – Estava faltando comida e...
– Claro que tinham! – interrompeu Maria – Se estava faltando comida aqui na floresta, poderíamos ter ido para a aldeia.
– Não é tão simples assim. – retrucou o menino – Você sabe que eu estou doente.
– Não importa! – exclamou Maria – Somos uma família e você deveria ficar com a gente, mesmo tendo essa doença.
– Acho bom vocês pararem de tagarelar! – gritou a bruxa, enquanto enchia o caldeirão com água – Estão estragando o meu apetite!
– Precisamos fugir daqui! – disse João, quase sussurrando – Ela quer nos devorar.
– Sim, acho que hoje mesmo! – concordou a menina.
– Parem de cochichar! – ordenou a bruxa – Se continuarem me irritando, o meu ensopado terá duas crianças ao invés de uma!
– Isso é o que você pensa, sua velha nojenta! – retrucou Maria – Você sabia que hoje é noite de lua cheia? O lobisomem vai aparecer e devorar essas suas pelancas horríveis!
– Por satanás! Que menina desbocada! – exclamou a bruxa – Eu deveria arrancar a sua língua para lhe ensinar a me respeitar!
– A Maria tem razão! – interveio João – O lobisomem vai acabar com você!
– Lobisomem?! Faz um bom tempo que não aparece um daqueles cães sarnentos aqui nessa floresta. – disse a bruxa – Mas se vocês fossem espertos saberiam que se um lobisomem entrasse aqui ele devoraria não só a mim, mas a vocês também!
– Não se estivermos dentro dessas jaulas! – respondeu Maria, em tom debochado – O lobisomem é forte, mas não consegue quebrar barras de ferro dessa grossura.
– Ah! Agora eu entendi! – gritou a bruxa – Vocês estão blefando para tentar me induzir a tirá-los das jaulas, não é mesmo! Pois podem desistir! Daí vocês só saem para ir direto ao caldeirão!
Nesse momento, a lua cheia começou a despontar por detrás das seculares árvores da floresta. João sentiu um perturbador arrepio lhe percorrer a espinha ao mesmo tempo em que o seu coração começou a bater mais aceleradamente.
– A lua cheia está surgindo! – sussurrou o garoto – Tem que ser agora!
– Certo! – concordou a menina.
– Você sabe que está certa quanto à jaula, não é mesmo? – disse João – Não precisa ter medo, pois o lobisomem não conseguirá te pegar ai dentro.
– Sim, eu sei. – respondeu Maria.
Então, João postou-se de pé, chacoalhando e chutando as grades provocativamente, enquanto se dirigia à bruxa.
– Sua velha corcunda e nariguda! Mesmo que você não nos devore vamos acabar morrendo de tanto nojo dessa sua cara medonha! – gritou o menino – Acho melhor você me matar logo, pois não aguento mais sentir esse seu cheiro horrível! Você fede mais do que um gambá!
Tomada pelo ódio, a bruxa abriu a jaula de João e tentou agarrá-lo pelos cabelos, mas, para a sua surpresa, o garoto se desviou de forma incrivelmente ágil e, com uma força descomunal, atingiu-a com uma bofetada que a fez estatelar-se no chão.
Em seguida, o que saiu de dentro da jaula já não era mais um menino, mas sim um ser metamorfo que rasgava as próprias roupas enquanto seu corpo se convertia em algo enorme e monstruoso.
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